Férias proporcionais na dispensa por justa causa?

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Um decisão recente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que reconheceu o direito às férias proporcionais mesmo no caso de dispensa por justa causa, fundamentada na Convenção 132 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), representa mais um passo rumo a consolidação de um novo entendimento. Como especialista em Direito do Trabalho, preciso admitir que essa decisão me fez repensar conceitos que carrego desde a faculdade.

O que é ensinado

Durante toda minha formação, tanto na graduação quanto na pós-graduação, aprendi que a justa causa era uma penalidade máxima: o empregado que cometesse falta grave perderia direito a todas as verbas rescisórias de natureza indenizatória, incluindo as férias proporcionais. Essa era a interpretação ensinada nas universidades e aplicada pela maioria dos tribunais por décadas.

O raciocínio parecia lógico: se o trabalhador deu causa ao rompimento do contrato através de conduta grave, perderia o direito às verbas que teriam caráter compensatório ou indenizatório. As férias proporcionais, nessa visão tradicional, eram enquadradas nessa categoria, sendo, portanto, incompatíveis com a justa causa.

A mudança de perspectiva

Contudo, já há algum tempo venho observando uma mudança em alguns tribunais trabalhistas. Juízes e desembargadores começaram a questionar essa interpretação restritiva, especialmente considerando que o direito a férias está expressamente previsto no artigo 7º, XVII, da Constituição Federal como direito fundamental do trabalhador.

Os magistrados argumentavam que as férias representam um direito constitucional essencial à preservação da dignidade humana do empregado. Sob essa ótica, mesmo o empregado que comete falta grave teria trabalhado e, consequentemente, teria direito ao período de descanso proporcional aos serviços prestados.

A convenção 132 da OIT

A decisão do TST trouxe um elemento adicional e robusto para essa discussão: a aplicação da Convenção 132 da OIT, ratificada pelo Brasil. Este instrumento internacional estabelece que todo trabalhador tem direito a férias anuais remuneradas, sem fazer qualquer ressalva quanto à forma de terminação do contrato de trabalho.

A força normativa dos tratados internacionais sobre direitos humanos no ordenamento jurídico brasileiro, especialmente após a Emenda Constitucional 45/2004, conferiu peso significativo a esse argumento. A Convenção 132, ao não prever exceções para casos de justa causa, reforça a tese de que o direito a férias proporcionais transcende as circunstâncias do término da relação empregatícia.

Mudando o meu entendimento

Diante desses argumentos e da crescente jurisprudência nesse sentido, devo ser honesto: estou aderindo a essa nova corrente. A combinação entre o fundamento constitucional e o respaldo internacional da Convenção 132 da OIT são a base dessa mudança.

Isso significa reconhecer que o direito é dinâmico e que interpretações podem evoluir quando surgem argumentos mais consistentes com os princípios fundamentais do ordenamento jurídico.

Não vale para todas as verbas proporcionais

É importante esclarecer que essa nova orientação se restringe especificamente às férias proporcionais. O décimo terceiro salário proporcional continua não sendo devido nos casos de justa causa.

Essa diferenciação demonstra que não estamos diante de um afrouxamento generalizado das consequências da justa causa, mas de uma interpretação sobre o que está previsto na própria Constituição Federal.

Entendimento contrário não está errado!

Seria leviano da minha parte apresentar essa questão como definitivamente resolvida. O tema ainda divide opiniões respeitáveis na doutrina e jurisprudência trabalhistas. Tribunais regionais mantêm posicionamentos divergentes, e mesmo entre os ministros, até o momento, do TST não há unanimidade absoluta sobre todos os aspectos dessa interpretação.

Tecnicamente, não existe um “certo e errado” definitivo neste momento. Estamos vivenciando um período de transição paradigmática, onde argumentos sólidos de ambos os lados coexistem e competem por aceitação nos tribunais. Essa é, aliás, uma característica natural da evolução do direito.

É preciso estar atualizado

Essa situação reforça uma lição fundamental para todos nós, operadores do direito trabalhista: a necessidade de manter-se constantemente atualizado com as mudanças jurisprudenciais. O direito do trabalho, mais que outras áreas, é particularmente dinâmico, refletindo transformações sociais, econômicas e interpretativas.

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