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O Senado Federal deu um passo importante na quarta-feira (22 de outubro) para reconhecer e valorizar uma categoria profissional fundamental, mas historicamente negligenciada: os professores da educação infantil. A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) aprovou o Projeto de Lei 2.387/2023, que inclui esses profissionais na carreira do magistério, garantindo-lhes acesso ao piso salarial nacional da categoria e aos planos de carreira da educação básica.
A proposta, relatada pela senadora Leila Barros (PDT-DF), agora segue para análise da Comissão de Educação e Cultura (CE), onde deverá ser debatida antes de eventual votação no plenário do Senado.
O que muda na prática
Atualmente, muitos professores que atuam na educação infantil — etapa que compreende o atendimento a crianças de zero a cinco anos de idade — não são formalmente reconhecidos como parte da carreira do magistério em diversos municípios e estados. Isso resulta em uma série de prejuízos trabalhistas e profissionais:
Exclusão do piso salarial nacional: Enquanto professores do ensino fundamental e médio têm direito ao piso nacional do magistério (atualmente em R$ 4.420,55 para jornada de 40 horas semanais, conforme valores de 2024), muitos profissionais da educação infantil recebem salários significativamente inferiores.
Ausência de planos de carreira: Sem enquadramento formal na carreira do magistério, esses professores ficam sem acesso a progressões, gratificações e benefícios previstos nos planos de carreira da educação básica.
Desvalorização profissional: A exclusão formal contribui para a percepção equivocada de que o trabalho na educação infantil seria menos relevante ou exigiria menor qualificação do que nas demais etapas da educação.
Instabilidade e precarização: Muitos desses profissionais são contratados temporariamente ou em condições precárias, sem os direitos e garantias típicas da carreira do magistério.
Com a aprovação do PL 2.387/2023, esses professores passariam a ter os mesmos direitos dos demais profissionais do magistério, incluindo piso salarial, planos de carreira estruturados, possibilidade de progressão funcional e acesso a formação continuada.
A senadora Leila Barros, relatora do projeto, destacou em seu parecer a necessidade de corrigir essa distorção histórica. “Não podemos continuar tratando como menos importantes os profissionais que trabalham com nossas crianças na fase mais crucial do desenvolvimento. A educação infantil exige formação, dedicação e competência tanto quanto qualquer outra etapa educacional”, afirmou a parlamentar.
O cenário atual da categoria
De acordo com dados do Censo Escolar, o Brasil conta com aproximadamente 600 mil professores atuando na educação infantil. Destes, uma parcela significativa não está enquadrada formalmente na carreira do magistério, especialmente em municípios de pequeno porte.
A situação é particularmente crítica entre professores de creches, onde predominam contratos temporários, terceirizações e até contratações informais. Muitos desses profissionais possuem formação em Pedagogia ou Normal Superior, requisito legal para atuação na educação infantil, mas não têm acesso aos mesmos direitos de colegas que lecionam no ensino fundamental ou médio.
Sindicatos e entidades representativas da categoria, como a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), celebraram a aprovação do projeto na CAE. “É um reconhecimento há muito esperado. Professores da educação infantil fazem um trabalho pedagógico complexo e fundamental, e merecem ser tratados como os profissionais do magistério que são”, declarou representante da entidade.
Impactos para municípios e estados
A aprovação do projeto trará impactos financeiros diretos para estados e, especialmente, municípios, que são os principais responsáveis pela oferta de educação infantil no Brasil.
Gestores municipais terão que adequar planos de carreira, rever tabelas salariais e garantir o enquadramento dos professores da educação infantil nas mesmas condições dos demais profissionais do magistério. Em muitos casos, isso significará aumento de despesas com pessoal.
Entidades municipalistas, como a Confederação Nacional de Municípios (CNM), têm manifestado preocupação com a capacidade financeira dos entes federativos menores de arcar com os custos adicionais. A entidade defende que a União amplie repasses do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) para viabilizar a implementação da medida sem comprometer outras áreas da educação municipal.
Por outro lado, especialistas em financiamento da educação argumentam que a medida apenas corrige uma distorção histórica e que recursos do Fundeb já deveriam estar sendo utilizados adequadamente para remunerar todos os profissionais da educação básica, incluindo os da educação infantil.
Próximos passos
Aprovado na CAE, o PL 2.387/2023 segue agora para a Comissão de Educação e Cultura (CE) do Senado, onde será analisado sob a perspectiva pedagógica e das políticas educacionais. A expectativa é que o projeto seja apreciado ainda no primeiro semestre de 2025.
Caso seja aprovado na CE, o projeto seguirá para votação no plenário do Senado. Se aprovado pelos senadores, será encaminhado à Câmara dos Deputados para análise. Apenas após aprovação nas duas casas legislativas e eventual sanção presidencial, a medida entrará em vigor.
Especialistas estimam que, no melhor cenário, a inclusão formal dos professores da educação infantil na carreira do magistério possa se concretizar até o final de 2025 ou início de 2026, a depender da tramitação nas duas casas legislativas.
Repercussão e expectativa
A aprovação na CAE foi recebida com otimismo por entidades sindicais, movimentos sociais ligados à educação e especialistas em políticas educacionais. Para esses atores, trata-se de uma medida de justiça social e de reconhecimento da importância pedagógica da educação infantil.
Para os profissionais diretamente afetados, a expectativa é de que a medida resulte em melhorias concretas nas condições de trabalho, valorização salarial e maior reconhecimento social da profissão.
A aprovação do PL 2.387/2023 na Comissão de Assuntos Econômicos representa um avanço significativo no reconhecimento e valorização dos professores da educação infantil. Embora ainda precise percorrer um longo caminho legislativo até se tornar realidade, o projeto sinaliza uma mudança de mentalidade em relação à importância dessa etapa educacional e dos profissionais que nela atuam.
Para advogados trabalhistas, a eventual aprovação da medida abrirá campo para ações de enquadramento, equiparação salarial e cobrança retroativa de diferenças. Para gestores públicos, representará desafio de adequação orçamentária e reestruturação de planos de carreira. Para os professores da educação infantil, significará, finalmente, o reconhecimento de que educar crianças pequenas é tão importante e tão digno de valorização, quanto qualquer outra atividade do magistério.
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