Criação de núcleos de mediação trabalhista é discutido na Câmara

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A Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados realizou audiência pública para discutir a criação, pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), de núcleos de mediação de conflitos trabalhistas em todo o país.

O debate atende a pedido do deputado Leonardo Monteiro (PT-MG). Segundo ele, a proposta busca reforçar o papel do ministério na mediação e na prevenção de conflitos individuais, oferecendo um serviço gratuito para trabalhadores que hoje não dispõem de instrumentos eficazes de resolução de disputas fora da Justiça.

Núcleos nas Superintendências Regionais

Leonardo Monteiro afirma que os núcleos estão previstos para serem instalados nas Superintendências Regionais do Trabalho, espalhadas por todo o território nacional. A iniciativa contribuirá para a prevenção de litígios e para a pacificação social nas relações de trabalho. A estrutura aproveitaria a capilaridade já existente do Ministério do Trabalho, com unidades em todos os estados brasileiros, facilitando o acesso dos trabalhadores ao serviço de mediação.

Sobrecarga da Justiça do Trabalho

A urgência se revela diante da sobrecarga da Justiça do Trabalho, que atualmente acumula mais de 5 milhões de processos em tramitação e recebe cerca de 4 milhões de novas ações anualmente, com tempo médio de julgamento que pode variar de 2 a 5 anos. Esses números revelam a dimensão do problema: milhões de trabalhadores aguardam anos para ter seus direitos reconhecidos, gerando insegurança jurídica tanto para empregados quanto para empregadores.

Além do tempo prolongado, o processo judicial trabalhista envolve custos significativos para o trabalhador, como honorários advocatícios em caso de derrota (após a reforma trabalhista de 2017), custas processuais, honorários periciais, tempo de espera sem receber os valores devidos e desgaste emocional. Para o empregador, há também honorários advocatícios, custas processuais, depósitos recursais, tempo de gestão dedicado ao processo e risco de condenações com valores acrescidos de juros e correção monetária. Para o Estado, os custos envolvem a manutenção da estrutura da Justiça do Trabalho, com magistrados, servidores e infraestrutura, recursos públicos que poderiam ser direcionados a outras áreas.

Mediação: solução rápida e econômica

O deputado acrescenta que a mediação trabalhista pode encerrar conflitos em sessões únicas de até 60 minutos, oferecendo soluções muito mais rápidas e econômicas do que o processo judicial tradicional. A mediação é um método de resolução de conflitos em que um terceiro imparcial (o mediador) facilita o diálogo entre as partes para que elas mesmas encontrem uma solução consensual.

A mediação é voluntária, ou seja, as partes decidem livremente participar. É também confidencial, pois o que é discutido não pode ser usado em processo judicial posterior. Além disso, é rápida, podendo ser concluída em uma ou poucas sessões, econômica, com custos muito menores que um processo judicial, flexível, permitindo que as partes criem soluções criativas não limitadas ao que um juiz poderia determinar, e preserva as relações, pois o diálogo facilita a manutenção de boas relações entre as partes.

Para o trabalhador, as vantagens incluem resolução rápida do conflito, recebimento mais célere de valores devidos, ausência de custos (serviço gratuito oferecido pelo MTE), menos desgaste emocional e maior controle sobre o resultado. Para o empregador, há economia de tempo e recursos, previsibilidade dos custos, manutenção da imagem institucional, possibilidade de acordos mais flexíveis e redução de passivo trabalhista. Para a sociedade como um todo, os benefícios são o desafogamento da Justiça do Trabalho, pacificação social, economia de recursos públicos e celeridade na resolução de conflitos.

Experiências no Brasil

O Brasil já possui algumas experiências de mediação e conciliação trabalhista. A Justiça do Trabalho mantém Centros Judiciários de Métodos Consensuais de Solução de Disputas (Cejusc) em diversos tribunais regionais, oferecendo mediação e conciliação em processos já judicializados, com resultados positivos e altas taxas de acordo. As Comissões de Conciliação Prévia (CCP), criadas pela CLT em 1998, são órgãos paritários com representantes de empregados e empregadores que buscam a conciliação antes do ajuizamento de ações, embora seu uso tenha sido limitado. Alguns sindicatos e federações mantêm núcleos intersindicais de conciliação que buscam resolver conflitos antes da judicialização, mas com alcance restrito aos representados.

Diferencial da proposta

A criação de núcleos de mediação pelo Ministério do Trabalho e Emprego apresenta diferenciais importantes em relação às experiências existentes. O serviço será totalmente gratuito, ao contrário de câmaras privadas de mediação, com abrangência nacional através da presença em todos os estados pelas Superintendências Regionais. A acessibilidade será ampliada, facilitando o acesso de trabalhadores que não têm condições de contratar advogado ou não conhecem seus direitos. O caráter preventivo permite atuar antes da judicialização, evitando o ajuizamento de ações. A imparcialidade é garantida por mediadores vinculados ao Estado, sem conflito de interesses, com expertise e conhecimento especializado em direito do trabalho.

Desafios da implementação

A criação dos núcleos de mediação enfrentará desafios importantes relacionados à estrutura e recursos. Será necessário investimento em capacitação de mediadores especializados, infraestrutura física adequada nas Superintendências, sistemas informatizados para gestão dos casos e divulgação do serviço para trabalhadores e empregadores.

Como a mediação é voluntária, a adesão das partes será fundamental. Por isso, será necessário conscientizar empregadores sobre os benefícios do método, informar trabalhadores sobre a existência do serviço e construir confiança no processo de mediação como alternativa legítima à judicialização.

A articulação institucional também será essencial, pois os núcleos precisarão articular-se com a Justiça do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho, os sindicatos de trabalhadores e patronais, e a advocacia trabalhista para que o sistema funcione de forma integrada e complementar.

Outro desafio fundamental é garantir que a mediação não resulte em renúncia de direitos, respeite os princípios de proteção ao trabalhador, não substitua a atuação da Justiça do Trabalho quando necessária e seja realmente voluntária e não imposta às partes.

Contexto pós-reforma trabalhista

A proposta ganha relevância especial após a reforma trabalhista de 2017, que dificultou o acesso à Justiça do Trabalho ao instituir custas processuais para todos os trabalhadores, criar honorários de sucumbência (obrigando o trabalhador que perde a pagar o advogado da empresa), estabelecer honorários periciais e criar multas por litigância de má-fé. Essas mudanças inibiram muitos trabalhadores de buscar seus direitos na Justiça, criando uma “lacuna de proteção” que os núcleos de mediação podem ajudar a preencher, oferecendo uma alternativa gratuita e acessível de resolução de conflitos.

Relação com a Justiça do Trabalho

Os núcleos de mediação não substituem nem concorrem com a Justiça do Trabalho. Pelo contrário, atuam de forma complementar. A mediação nos núcleos do MTE atua de forma preventiva, antes da judicialização, buscando acordo consensual entre as partes. Já a Justiça do Trabalho atua de forma adjudicatória (impositiva), decidindo conflitos quando não há acordo ou quando há questões de direito que exigem pronunciamento judicial. A existência dos núcleos pode, inclusive, valorizar o papel da Justiça do Trabalho ao permitir que os magistrados se dediquem a casos mais complexos que realmente exigem decisão judicial, melhorando a qualidade da prestação jurisdicional.

Expectativas e próximos passos

Se implementados adequadamente, os núcleos de mediação de conflitos trabalhistas podem reduzir em até 30% o número de novas ações na Justiça do Trabalho, resolver conflitos em semanas em vez de anos, economizar recursos públicos com manutenção da estrutura judicial, gerar acordos mais satisfatórios para ambas as partes, fortalecer a cultura do diálogo nas relações de trabalho e ampliar o acesso à justiça para trabalhadores em situação de vulnerabilidade.

A audiência pública é um primeiro passo importante para construir consensos sobre o modelo de implementação dos núcleos. Será necessário definir o modelo de funcionamento, estabelecer critérios de capacitação dos mediadores, garantir recursos orçamentários para implementação, criar regulamentação específica, elaborar protocolos de atuação, desenvolver sistema de acompanhamento e avaliação, e planejar divulgação ampla do serviço para que trabalhadores e empregadores conheçam e confiem nessa nova ferramenta de resolução de conflitos.

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