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O Tribunal Superior do Trabalho está prestes a julgar uma das questões mais polêmicas e impactantes do direito trabalhista brasileiro: a possibilidade de empresas demitirem funcionários CLT e recontratá-los como pessoas jurídicas terceirizadas. A decisão, que será tomada sob a sistemática de recursos repetitivos, terá efeito vinculante em todo o país e pode mudar radicalmente o cenário da terceirização no Brasil, afetando milhões de contratos de trabalho.
O que o TST vai decidir
– Empresa pode demitir funcionário CLT e recontratá-lo como PJ terceirizado?
– A “pejotização” é válida quando o trabalhador exerce mesma função de antes?
– É possível reconhecer fraude mesmo com decisão do STF que liberou terceirização?
Essa decisão terá impacto em todo o país por terá efeito vinculante, afetando milhões de contratos de tercerização e definindo limites da “pejotização” no país.
Números da “pejotização” no Brasil
| Período | Trabalhadores que viraram PJ | Observação |
| 2022-2024 | 4,8 milhões | Passaram de CLT para PJ |
| Crescimento | Exponencial | Após reformar trabalhista 2017 |
Direitos trabalhistas perdidos com a “pejotização”:
- Férias remuneradas
- 13º salário
- FGTS
- Licença-maternidade
- Descanso semanal remunerado
- Horas extras
- Aviso prévio
Os dois casos que serão julgados:
Caso 1 (RR 1848300): Supervisora trabalhou na Brasil Telecom e depois foi contratada por empresa terceirizada para fazer o mesmo serviço; É fraude terceirizar ex-empregado com STF liberando terceirização?
Caso 2: (RRAg 373-67): Trabalhador constituiu PJ para prestar serviço à mesma empresa; É válida a “pejotização” de quem fazia função típica de empregado?
Prazo de quarentena, a Lei 6.019/74 estabelece:
– 18 meses de quarentena para recontratação de ex-empregado como terceirizado
– Empresa que descumprir pode ter a terceirização considerada ilícita
– Consequência: reconhecimento de vínculo empregatício
Os dois casos que serão julgados pelo TST envolvem situações emblemáticas e muito comuns no mercado de trabalho brasileiro. No primeiro processo, uma supervisora de atendimento trabalhou para a Brasil Telecom com carteira assinada. Após o término do contrato, foi contratada por uma empresa terceirizada (CBCC Participações) para atuar exatamente na mesma função de call center, prestando serviços para a mesma concessionária de telecomunicações.
No segundo caso, um trabalhador de Vila Velha (ES) constituiu pessoa jurídica e passou a prestar serviços à Imetame Energia, executando funções que antes eram realizadas por empregados CLT da empresa.
A questão central que o TST precisa resolver é se essas práticas configuram fraude à legislação trabalhista, mesmo após o Supremo Tribunal Federal ter decidido, em 2017, pela licitude de todas as formas de terceirização, incluindo a terceirização da atividade-fim das empresas. O dilema jurídico está em definir se a decisão do STF permite qualquer tipo de terceirização ou se existem limites quando há indícios claros de fraude aos direitos trabalhistas.
“Pejotização” no Brasil
A chamada “pejotização” ganhou força após a reforma trabalhista de 2017, que liberou a terceirização de todas as atividades empresariais. Antes da reforma, apenas atividades-meio, como limpeza, segurança e manutenção, podiam ser terceirizadas. Com a mudança, as atividades-fim, que são aquelas ligadas diretamente ao produto ou serviço principal da empresa, também passaram a poder ser executadas por firmas terceirizadas.
Dados do Ministério do Trabalho revelam que, entre 2022 e 2024, cerca de 4,8 milhões de trabalhadores que eram celetistas passaram a ser pessoas jurídicas. Embora não seja possível saber quantos continuaram atuando nas mesmas empresas, especialistas em direito trabalhista apontam que uma parcela significativa desses casos representa a mesma relação de trabalho, apenas com roupagem jurídica diferente.
Argumentos contra a “pejotização” fraudulenta
Os críticos da pejotização ilícita apontam diversos malefícios para o país. O primeiro e mais evidente é a precarização do trabalho e da vida do trabalhador. Quando um empregado CLT vira pessoa jurídica, perde direito a férias, 13º salário, FGTS, descanso semanal remunerado, licença-maternidade, horas extras, aviso prévio e diversos outros direitos garantidos pela CLT.
Além disso, há o impacto nas contas públicas. Trabalhadores pejotizados contribuem menos para a Previdência Social, o que pode comprometer o sistema previdenciário no longo prazo. Há também perda de arrecadação de tributos trabalhistas como FGTS e contribuições sindicais, que financiam políticas públicas e a representação dos trabalhadores.
Outro ponto levantado é a concorrência desleal. Empresas que contratam todos os funcionários com carteira assinada têm custos maiores do que aquelas que pejotizam sua mão de obra. Isso cria distorções no mercado e pode levar a uma “corrida para o fundo”, em que empresas são pressionadas a adotar práticas de precarização para se manterem competitivas.
Do outro lado do debate, setores empresariais e alguns juristas defendem a liberdade contratual e argumentam que a pejotização pode ser uma opção legítima tanto para empresas quanto para trabalhadores. Segundo essa visão, muitos profissionais preferem atuar como pessoa jurídica porque têm mais flexibilidade, podem atender vários clientes simultaneamente e, em alguns casos, ter ganhos líquidos maiores.
O papel do TST e próximos passos
O Tribunal Superior do Trabalho abriu prazo para manifestações de cidadãos, órgãos e entidades interessados nos julgamentos. Os editais foram publicados em março de 2025, e sindicatos, confederações empresariais, associações de magistrados, Ministério Público do Trabalho e entidades da sociedade civil podem contribuir com argumentos e dados técnicos.
A expectativa é que o julgamento estabeleça diretrizes claras e uniformize a jurisprudência, trazendo maior segurança jurídica para empregados, empregadores e entidades sindicais. Ainda não há data marcada para o julgamento, mas a expectativa é que ocorra ainda em 2025, dado o grande número de processos sobrestados aguardando a definição.
A decisão do TST será fundamental para definir os limites entre a legítima contratação de pessoas jurídicas e a fraudulenta pejotização de relações de emprego. O tribunal terá que equilibrar a liberdade de iniciativa empresarial, consagrada constitucionalmente, com a proteção dos direitos fundamentais dos trabalhadores e a vedação à fraude à lei.
Se o TST decidir que é possível reconhecer fraude mesmo após a decisão do STF que liberou a terceirização, milhões de contratos poderão ser questionados judicialmente. Empresas que demitiram funcionários e os recontrataram como PJ podem ter que reconhecer o vínculo empregatício e pagar todas as verbas trabalhistas devidas, incluindo FGTS, férias, 13º salário e demais direitos suprimidos.
Por outro lado, se o tribunal entender que a decisão do STF autoriza qualquer forma de terceirização, desde que haja pessoa jurídica intermediando a relação, isso pode consolidar a pejotização como modelo de contratação no Brasil, com profundos impactos no mercado de trabalho e na proteção social dos trabalhadores.
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Jornalista; Assessor de Comunicação; Atuando também na produção de conteúdos sobre o mundo trabalhista e a justiça do trabalho no Brasil para o portal Direito do Empregado.
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