Segundo dados do IBGE[1], o Brasil finalizou 2019 com ao menos 11% da população desempregada, o que representa cerca de 12 milhões de desempregados no País.
Ocorre que, diante do cenário da Pandemia do Covid-19, que está causando verdadeiro estardalhaço nas relações de emprego, não irá demorar muito para que tais dados se multipliquem.
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Todavia, não bastasse o terror do desemprego, trabalhadores de todo o País ainda tem sofrido com rescisões equivocadas, que muitas vezes não comportam aplicação no caso conreto.
É o caso, por exemplo, da rescisão por força maior.
De acordo com o art. 501 da CLT, considera-se força maior todo “acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente.”
Por sua vez, o art. 502 da CLT em seu inciso II admite que, o empregador cujo estabelecimento tenha sido extinto por força maior, poderá rescindir o contrato de seus funcionários mediante o pagamento de apenas metade das verbas indenizatórias, isto é, aviso prévio e multa do FGTS, poderão ser pagos pela metade.
Com efeito, a Pandemia do Covid-19, pode ser enquadrada como motivo suficiente a ensejar a força maior, sobretudo após a edição da Medida Provisória 927, que no parágrafo único do art. 1ª dispõe que “(…) para fins trabalhistas, constitui hipótese de força maior, nos termos do disposto no art. 501 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.”.
Desta feita, temos que a própria MP já reconhece a possibilidade do uso da força maior em virtude da Pandemia.
Ocorre que, ao utilizar tal subterfúgio, a empresa deve ter cautela, haja vista que o dispositivo não possui interpretação ampla, mas sim, restritiva. Isto equivale a dizer que, embora a Pandemia do Covid-19, possa ser enquadrara como motivo suficiente para reconhecimento da força maior, a empresa ainda terá que preencher outro requisito, como o do efetivo prejuízo, que tenha como consequência seu encerramento, ou seja, fechamento do estabelecimento.
Outrossim, nem todos os contratos podem ser rescindidos com pagamento indenizatório pela metade, é o caso, por exemplo, dos trabalhadores detentores de estabilidade provisória.
Nesse sentido, a Jurisprudência é unânime quanto ao fato de que a força maior poderá ser aplicada para rescindir o contrato de trabalho do empregado detentor de estabilidade provisória, no entanto o pagamento das verbas indenizatórias não poderá ser feito pela metade como determina o II do art. 502 da CLT.
Assim, ainda que reconhecida a força maior, nos termos do art. 501 da CLT, o empregado detentor da estabilidade poderá ter seu contrato rescindido, contudo, mediante o pagamento integral das verbas rescisórias.
Bom.
Mas e a indenização substitutiva da estabilidade provisória, como fica? Neste caso, a jurisprudência se divide.
Isso porque, parte da Jurisprudência entende que, tendo ocorrido acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, tendo como consequência o encerramento da empresa, morre também a estabilidade provisória.
Nesse sentido, é o entendimento esposado pelo e. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, vejamos:
ESTABILIDADE PROVISÓRIA ACIDENTE DO TRABALHO REQUISITOS LEGAIS REINTEGRAÇÃO E INDENIZAÇÃO SUBSTITUTIVA INCABÍVEIS POR IMPOSSIBILIDADE MATERIAL ENCERRAMENTO DAS ATIVIDADES DA RECLAMADA POR INTERVENÇÃO JUDICIAL- CASO DE FORÇA MAIOR – Para que se reconheça a estabilidade provisória decorrente do acidente de trabalho, em princípio, mister que haja a conjugação de dois requisitos: o afastamento do serviço por prazo superior a quinze dias e a percepção do auxílio-doença-acidentário. Entretanto, não se pode valorizar a frieza da letra da lei em detrimento do espírito do legislador, que pretendeu proteger a saúde do trabalhador e evitar sua dispensa arbitrária. Neste sentido, a jurisprudência já se sedimentou sobre a desnecessidade de haver o recebimento do auxílio-doença-acidentário para que seja reconhecida a estabilidade do art. 118 da Lei 8.213/91, nos casos de doença ocupacional, consoante a Súmula 378 item II/TST. Prevalece o entendimento de que o fato de o INSS ter concedido o auxílio-doença comum, ao revés do acidentário, não vincula o juízo trabalhista, desde que comprovada a relação de causalidade entre a doença e as atividades laborais, uma vez que a enfermidade, em si e por si, é a verdadeira fonte material do direito. Na hipótese vertente, restou comprovado que a doença do Autor foi consequência do acidente de trabalho, equiparando-se, portanto, à doença ocupacional, para os fins legais. Destarte, o Reclamante é beneficiário da estabilidade provisória, que, todavia, se desfaz, por inteiro, em razão de força maior: fechamento da empresa e dos respectivos estabelecimentos, por decisão judicial, o que despotencializa a finalidade da lei, seja sob a ótica da reintegração, seja quanto à indenização substitutiva.
(TRT-3 – RO: 2425907 01129-2007-050-03-00-0, Relator: Luiz Otavio Linhares Renault, Quarta Turma, Data de Publicação: 16/02/2008, DJMG. Página 18. Boletim: Sim.) (grifo-nosso)
Conforme se observa, para o TRT da 3ª Região, não há que se falar em indenização substitutiva, ante a impossibilidade material, eis que houve encerramento da empresa por motivo que foge à vontade do empregador, desaparecendo assim, elemento essencial para a estabilidade.
Com todo respeito, mas ouso discordar do Douto Tribunal, no sentido de que, ainda que a empresa seja encerrada por motivo de força maior, é devida a indenização substitutiva ao detentor da estabilidade provisória.
Isso porque, quando estamos diante de estabilidade provisória pessoal, como aquela decorrente de acidente de trabalho ou de gravidez, temos que esta possui caráter protetivo com o fim de tutelar aquele que perdeu sua saúde, ou a mãe e seu bebê que acaba de nascer, portanto, são trabalhadores que não terão meios de se reinserir no mercado de trabalho tão cedo.
Aqui, vale invocar ainda, a atenção ao princípio da dignade da pessoa humana, inserta no art. 1º, III da Constituição Federal, assim como o do valor social do trabalho, que também se encontra postualdo no art. 1º da Constituição, porém, no inciso IV.
Desta feita, tem-se que a força maior não desobriga o empregador do pagamento de indenizações substitutivas, exeto no que tange ao dirigente sindical ou da CIPA, já que, uma vez encerrada a atividade da empresa, impossível a manutenção de sua estabilidade, eis que esta perde inclusive o objeto de existir.
A jurisprudência, conforme dito alhures, também caminha nesse mesmo sentido:
INDENIZAÇÃO RELATIVA À ESTABILIDADE ACIDENTÁRIA – FECHAMENTO DA EMPRESA – A estabilidade acidentária tem como objetivo assegurar a sobrevivência do empregado, no período posterior ao restabelecimento do empregado; caracterizando-se como garantia pessoal com caráter social. Por outro lado, os riscos do empreendimento são do empregador, e não do empregado, por força expressa de lei (artigos 2º e 3º da CLT), de forma que o fechamento da empresa não tem o condão de frustrar o direito à estabilidade em questão.
(TRT-20 – RECORD: 515004120085200003 SE 0051500-41.2008.5.20.0003, Data de Publicação: DJ/SE de 25/05/2009) (grifo-nosso)
Portanto, ao aplicar a rescisão por força maior, é recomendável, que seja garantida a indenização substitutiva ao detentor da estabilidade provisória, eis que a este trabalhador momentaneamente carente, não poderá ser aplicado os termos do art. 502, II da CLT
Sthefania Machado
Advogada trabalhista. Especialista em Processo Civil pela Faculdade de Direito de Vitória (FDV) e Pós-graduanda em Direito Previdenciário. Siga no Instagram: @adv.sthefania
[1] Disponível em <https://www.ibge.gov.br/indicadores#desemprego> Acessado em 11/05/2020.
Mestre em Direito; Professor; Advogado; Especialista em relações trabalhistas desde 2013. É fundador e CEO do Portal Direito do Empregado que conta com milhões de seguidores nas redes sociais.
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